Da Biologia aprendemos que "todo vertebrado é um cordado, mas nem todo cordado é vertebrado". Musiquinhas em salas de aula nos faziam memorizar isso, e deu tão certo que hoje, aos mais de 30, ainda não saiu da cabeça.
O fato é que isso tem utilidade não só para o ser vivo, mas também para as empresas. Para elas, é certo, há que se fazer uma adaptação, mas a essência permanece e deveria ser levada seriamente em consideração por todo e qualquer profissional de marketing:
“Toda marca tem por trás uma empresa, mas nem toda empresa tem a sua frente uma marca”.
É incrível que ainda hoje, século XXI, consumidor afinado com as mais requintadas formas de approach das marcas, ainda vemos empresas cujas marcas subsistem. São geralmente empresas de alguma forma relacionadas com ou advindas do ramo de tecnologia, ou cujos principais mentores são engenheiros de formação, e acabam deixando para segundo plano a maneira de se apresentar para o consumidor. Nada contra os engenheiros, que fique bem claro. Sem eles não teríamos as grandes invenções de produtos que chegam a nós e são capazes de mudar até mesmo a maneira de a gente se relacionar com os outros, de se comportar, de pensar, de viver.
Mas é exatamente essa proporção que falta a algumas empresas. Elas se concentram totalmente na tecnologia ou na alta qualidade dos produtos que elaboram, achando que isso é suficiente para alcançar o outro lado da ponta, o consumidor.
Alguma razão há nessa crença. Alguns vão dizer que a Apple – sempre a Apple – nunca se preocupou com uma forma impactante de falar com o consumidor. Vão dizer que ela se preocupou é com a forma inovadora de fazer seus produtos – e voilà, são os consumidores que, no fim das contas, correm atrás dela.
Ao contrário do consumidor dos anos 50, o consumidor de hoje só vai correr atrás da sua empresa ou de seu produto apenas se você for capaz não só de inovar, mas de revolucionar um hábito. O sucesso da Apple que chega aos olhos do consumidor vem sobretudo de duas coisas: a complexidade mínima de usar seus produtos; e o design máximo que os entorna. É beleza de top model por fora com inteligência de Einstein por dentro, o suficiente para fazer qualquer iniciante se dar bem com a máquina e não lembrar, em nada, aquelas velharias complicadas dos anos 70. A atração dos produtos da Apple é tão grande que, de fato, dispensa comentários, dispensa comunicação, dispensa o se aproximar do outro lado da ponta, já que ela consegue fazer com que, naturalmente, essa outra ponta é que se aproxime de si.
Só que não se encontra empresa capaz de revolucionar a categoria da noite pro dia. Milhares são as empresas cujos produtos são por demais semelhantes com os do concorrente. Se você tem um produto revolucionário, jogue fora este texto. Mas provavelmente você vende coisa que muitos outros podem vender, com a mesma qualidade, com os mesmos atributos. É nesse momento que a empresa não pode se dar ao luxo de focar apenas o produto; precisa lançar mão de ferramentas que de alguma forma mostrem para o consumidor que esse produto tem um quê que pode fazer toda a diferença. A diferença é quase sempre subjetiva, quando não sutil, mas necessariamente vinda das arestas paralelas que cercam o produto principal, como atendimento, forma de vender, valores da empresa, personalidade dela, sua marca.
Contar apenas com a qualidade do produto deixa sua empresa muito limitada no alcance ao público. Construir uma marca, usando preferencialmente a sempre prudente ferramenta da brand architecture, alarga essa dimensão ao fazer com que o público veja que, além de um produto material, ele está adquirindo um jeito de pensar, de se posicionar, uma linguagem que combina com ele. O produto dá uma oferta material, e a marca dá a oferta de valor.
É pena ver produtos da mais alta qualidade tendo uma comunicação nada proporcional a eles. Aliás, nem chega a ser comunicação: o que elas fazem é informar, não comunicar. Informar é dizer o que existe por qual preço até tal data. Comunicar é sugerir o uso em determinada situação, de tal jeito que você tenha uma vantagem competitiva por fazer daquela forma. Já reparou como empresas grandes de marcas pequenas aparecem pouco e, quando aparecem, mais informam do que conversam com o público? Não adianta ser bom se as pessoas não te conhecem a fundo, coisa que vale tanto para um profissional quanto para um produto...
Já que a Biologia entitula este pensamento, que reparem que a marca é uma evolução da empresa, espécie que sobrevive graças às vendas de seus produtos, é certo, mas as vendas de seus produtos, diante de tantos similares, só acontecem nos dias de hoje se além da oferta de preço o público percebe uma oferta de personalidade. As pessoas consomem não pela necessidade material, mas, sim, pela necessidade de encontrar seu próprio estilo, sua própria marca, na marca alheia.
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